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Percursos de Autor - Da Weasel

Da Weasel por Luís Filipe Catarino
DJ Glue, Carlão, Guilherme, Quaresma, João Nobre e Virgul, no final de um ensaio da banda no Teatro-Estúdio António Assunção

Que Almada é a cidade dos Da Weasel, todos sabem. Mas que ruas viram os primeiros passos da banda, que locais ouviram as suas primeiras rimas e acordes, que recantos testemunharam o seu crescimento musical e que vivências moldaram os seus talentos? Entrámos na toca da doninha, e fizemos uma tourpela cidade onde a paisagem urbana se funde com a história da icónica banda.

Texto de Ana Paula Cruz
Fotografia de Luís Filipe Catarino

Marcámos encontro no Teatro-Estúdio António Assunção, no final de um dos ensaios de preparação do MEO Marés Vivas. Os Da Weasel foram cabeça de cartaz” no primeiro dia do festival, mas na altura da entrevista ainda estavam longe de imaginar que seriam eles a esgotar o Marés Vivas, repetindo o feito no reencontro da banda, no NOS Alive do ano passado. Os ensaios, como não poderia deixar de ser, aconteceram na toca da doninha. Sentimo-nos muito bem aqui em Almada (acho que posso falar por todos). Conhecemos muito bem esta cidade. Sentimo-nos literalmente em casa. Somos de Almada, por isso não faria sentido estarmos a ensaiar noutro sítio. Sempre ensaiámos aqui”, começa por nos referir João Nobre, acrescentando que para preparar o Alive, ensaiaram na Incrível Almadense.

Ponto de Encontro: Aqui foi a nossa estreia como músicos”

Iniciamos a tour” no Ponto de Encontro (Casa Municipal da Juventude), por cima do Cais do Ginjal, em Cacilhas, um local de referência para a comunidade artística e para os jovens de Almada. Quaresma lança: Aqui foi a nossa estreia como músicos. O meu primeiro concerto foi aqui”. O meu também”, ri Carlão, lembrando o nome da sua banda da altura [Incesto].

Quaresma assume o solo e descreve: Aqui era onde a malta toda em Almada se encontrava. Músicos, pessoas do teatro e da dança. Pelo menos da minha geração. Quando isto abriu havia sempre concertos todos os fins de semana, com esta vista magnífica para Lisboa. (…) Curiosamente, juntavam-se aqui várias tribos, desde o metal aos góticos [‘Capela das Almas, fogo!’ exclama, Carlão], sei lá. Tudo se dava bem. Conhecíamo-nos todos uns aos outros. Toda a gente tinha uma banda ou tocava numa banda. Era engraçado. Influenciávamo-nos uns aos outros, ouvíamos as bandas uns dos outros e ao fim e ao cabo, acaba por não haver um som próprio de Almada, mas havia muitas coisas a serem feitas aqui em Almada e ainda há. Almada ainda é uma referência. Agora não tens é bandas”. Carlão completa: Mesmo os grandes estúdios, desapareceram um bocado, porque cada vez mais é possível gravar em espaços pequenos, ou mesmo em casa”. O DJ Glue concorda: acho que tem mais a ver com a maneira de se fazer música agora” e conta também a sua ligação à Casa da Juventude: Eu comecei a tocar como baixista e o meu primeiro concerto foi aqui. Na altura o que eu estava a viver era mais o hardcore, nem sequer tinha nada a ver com hip hop. O meu primeiro Dj set de sempre também foi aqui, e foi onde o Quaresma me convidou a ir fazer uma audição ao Zé da Cadela”.

A Garagem do Zé da Cadela: o sítio onde crescemos para a música”

DJ Glue dá a dica e a próxima paragem só podia ser na Garagem do Zé da Cadela. Mal entraram na rua de garagens, depois da memória falhar sobre qual seria o número correto, Quaresma arrisca e bate. Para grande festa de todos e num episódio completamente inusitado, o próprio Zé da Cadela surge à porta. Vínhamos aqui bater uma chapa”, explica Carlão. Obrigado por se terem lembrado de mim, pá!”, agradece o famoso Zé da Cadela. Fazes parte da nossa história”, diz João Nobre. E de muitas histórias”[Guilherme]. Mas olha, não estávamos à espera de te encontrar aqui”, refere Carlão. Tudo a correr bem e boa cena para o futuro. Um abraço”, despede-se o Zé da Cadela. Caraças, está igual”, comenta Carlão.

João Nobre descreve a Garagem: este é o sítio onde crescemos para a música. Era aqui que encontrávamos outros músicos, fazíamos contactos. Foi aqui, por exemplo, que houve o contacto para o Guilherme vir para a banda, o irmão dele ensaiava aqui com os Clandestinos e disse-nos Vocês andam à procura de baterista? Conheço um tipo ideal para tocar convosco’”. Quaresma confirma e lembra havia um género de classificados. Pendurávamos um papel: é preciso baixista”.

Todas as bandas de Almada passaram aqui”, diz João contando que começou a tocar aqui com 17 anos. Alugávamos o espaço, trazíamos os instrumentos, já havia bateria e amplificadores. E era incrível. Passávamos aqui altas tardes. Nós a sair, já outra banda para entrar, sempre este movimento, esta dinâmica que era brutal. E às vezes nem conseguíamos sala”. Quaresma recorda que em Almada era a melhor sala, a mais bem equipada. Na altura isto era um estúdio maravilhoso. Era o nosso castelo na Bavária para gravarmos as maquetes”. João conta que foi ali que fizeram “o ensaio da gravação do Podes Fugir Mas Não Te Podes Esconder. Foi o único álbum em que fizemos isso”. Quaresma interrompe com uma memória: Por vezes o Guilherme, por algum motivo atrasava-se e nós curtíamos com o Zé, lembram-se? O Zé era um excelente baterista. Ele dizia: eu posso, eu posso? e lá ia desenferrujar com a malta.” Ainda sobre o Zé da Cadela, João sugere vão à net, piquem Duarte e Companhia e oiçam o genérico. É ele na bateria.”

Praça da Liberdade: A malta saía da escola e parava aqui”

A caminho da Praça da Liberdade não escapam à atenção de alguns almadenses que os cumprimentam ou de outros mais novos, que pedem uma fotografia. A pergunta calha ao João e é inevitável. É fácil andar na rua aqui? Algumas pessoas conhecem-nos aqui desde pirralhos, então é inevitável que exista aquela abordagem quase de tio, ou de tia. Não é aquela abordagem de histerismo, ou de dê-me um autógrafo, mas mais tipo família: ‘Eu conheço aquele rapaz’”.

As pessoas estão habituadas a ver-nos por aqui”, diz Guilherme, o único de Lisboa. Morava ali em Alfama, S. Vicente. Apanhava o barco e vinha aqui para os ensaios. Primeiro Braindead e depois, mais tarde, Da Weasel.  Vinha muita malta de Lisboa para aqui, como a banda do meu irmão que estava a gravar no estúdio do João Martins. [João Nobre brinca: ‘Até a malta de Lisboa não é capaz de passar sem Almada, não é?’]. Antes já tinha estudado aqui. Era muito puto. Estava na 2ª ou 3ª classe. Vinha com o meu pai que dava aulas na António da Costa. Agora moro no Algarve, mas venho todas as semanas de autocarro a Almada, para os ensaios. Faz-se bem, já estou habituado. Até porque nem todos já estão a viver aqui em Almada. Acaba por ser sempre o ponto de encontro. Sempre foi e continua a ser.” João Nobre conclui: Honestamente, acho que se ensaiássemos noutro sítio não iramos ser felizes, não iria resultar.

Chegados à praça as memórias disparam. Aqui era a Escola Anselmo de Andrade provisória, ainda andei aqui um ano, depois foi demolida e ficou um parque de estacionamento”, diz Quaresma. Eu vinha aqui à Praça com a minha mãe”, lembra Virgul. Sim, a Praça onde está o Fórum Romeu Correia”, solta João. Dessa altura sobra só o relvado, o resto não tem nada a ver”. Carlão recorda que os Da Weasel deram um concerto numa tenda, nesta Praça. Era um festival, uma Semana da Juventude. Havia um concerto de bandas e nós tocámos em nome próprio e depois uma vez também tocámos no 25 de Abril”.

Este era um local de referência e reunião dos jovens, em Almada, para concertos, jogos da bola e namoros. A malta saía da escola e parava aqui” [Carlão]. Eu também vinha para aqui para este relvado com malta do Monte da Caparica. Juntávamo-nos e fazíamos beat box. Foi aqui que eu conheci a Sara, que era amiga comum do Carlão, que me levou até aos Da Weasel. Na altura eles andavam à procura de alguém. Até houve um anúncio no Blitz. Depois fui à casa dos vossos pais [irmãos Carlão e João] em Cacilhas”, conta Virgul.

Voltar a tocar nesta Praça, em casa, todos juntos, era uma coisa que lhes daria muito gozo. Apesar da responsabilidade acrescida, é fixe tocarmos para a malta que nos viu crescer e que mantém amizade connosco”, diz Virgul.

Cheers: o bar do runner dos Da Weasel

Nada como terminar no local que o grupo elege atualmente para os seus convívios, seja para almoçar, ver a bola, ou para beber um copo. O bar do Sérginho, o runner de sempre dos Da Weasel. Desde que abriu o bar, que vimos sempre cá. Estamos a ensaiar a cinco minutos daqui, diz Guilherme. Em comum com os locais anteriores, o Cheers tem o facto de ser mais um ponto de encontro e reunião para os almadenses. Este é um dos covis da doninha. Um lugar onde se fortificam laços de amizade e companheirismo e que tem nas paredes muitas marcas da banda.